No mês de junho, celebramos a natividade de São João Batista, de quem Deus trouxe ao coração de nosso fundador nossa espiritualidade e onde compreendemos nossa vocação enquanto Comunidade Católica Instrumento de Deus.
Nesta vocação, somos chamados a "Seguir à Jesus Cristo com disponibilidade, alegria e radicalidade”. E desse modo, cumprir a missão de "Ser voz de Deus no deserto das vidas." É importante falar deste carisma e dessa missão, para fazer a memória deste amigo que foi fiel aos amigos, à Deus e a este Carisma.
“Um amigo fiel é uma poderosa proteção: quem o achou, descobriu um tesouro. Nada é comparável a um amigo fiel, o ouro e a prata não merecem ser postos em paralelo com a sinceridade de sua fé. Um amigo fiel é um remédio de vida e imortalidade; quem teme ao Senhor, achará esse amigo. Quem teme ao Senhor terá também uma excelente amizade, pois seu amigo lhe será semelhante.” Eclesiástico 6,14-17
Há 20 atrás, este mês passou a ser ainda mais significativo para nós. Quando nosso irmão, Rafael Parisi Catarino, fez sua páscoa definitiva. Rafa - ou Jaca, como era chamado pelos amigos mais próximos - chegou até nós, num momento em que a comunidade era ainda um sonho no coração do fundador.
Sua mãe, a querida Sueli Parisi Catarino, chegou até o Fabinho, hoje Padre Fábio Lima, fundador da Comunidade e pediu a ele para convidar o Rafael para “o Grupo de vocês". Ele andava meio entristecido, só ficava em casa sozinho. Precisava de amigos. O convite foi feito e Rafael prontamente começou a participar daquele grupo.
Não demorou muito para que ele entendesse o que estava acontecendo ali, qual era o real objetivo daqueles jovens amigos que se reuniam quase todos os dias e rezavam de um jeito “diferente e esquisito”. Rafa abraçou com sua vida inteira aquele desejo de viver uma vida em comunidade, que primeiro era de Deus e depois, daqueles que caminhavam juntos naquele grupo.
Vivíamos o desejo de tornar concretos os planos de Deus. Pois era assim que o então Fábio, coordenador do Ministério Instrumento de Deus, nos ensinava: “Deus se faz concreto a cada passo que damos em direção à Sua voz”.
Esse nosso irmão, que foi chegando sem entender, já era um dos mais potentes promotores da evangelização que a comunidade realizava. Revelou-se para todos um menino feliz, alegre, criativo, muito engraçado e algumas vezes "mole" (como os meninos diziam), mas não se negava para Deus e sua Igreja.
Com sua alegria falava de Deus, costumava estar em todos os lugares e missões que seus irmãos de comunidade estivessem.
Queria estar! Queria viver! Queria ser! Havia entendido que era em Deus que desejava depositar a sua vida.
Sonhávamos com a concretização daquele modo de vida e o Rafael era um dos que sonhava com mais intensidade. Buscava viver a graça e a santidade em seu dia a dia, com pequenos gestos, palavras, missa diária e frequente confissão. Era muito zeloso em suas missões.
Amava o Ministério de Teatro, pelo qual havia sido atraído. E logo assumiu a missão de organizar um dos nossos mais importantes momentos devocionais, que eram as Grades de Oração. Que consistia em 24 horas de oração ininterrupta, rezadas desde as 18 horas da sexta-feira até às 18 horas de sábado. Cada irmão ocupando seu horário.
Ele era fiel e exortava os irmãos para que todos também o fossem. Cuidava de tudo, avisando os horários de cada um, disparando o e-mail com as orientações da grade, para que pudéssemos nos organizar. E ficava bravo com quem "quebrasse" a grade. E assim, foi buscando seu céu.
Fazia pouco tempo, o Ministério Missionário Shalom tinha lançado o CD "Lançai as redes" e nós ouvíamos muito todas as músicas. Mas as preferidas de Rafael eram “Bom Pastor” e "O Céu é meu". Ele a amava e cantava alto!
E o Rafa já estava tão embebido nessa graça que, certa vez, saindo para ir à Santa Missa num domingo de manhã, sofreu um sequestro relâmpago. O ladrão levou o carro, e junto, ele e a funcionária da casa, que estava abrindo o portão pra ele sair. Aquele dia foi muito marcante.
Primeiro, pelo temor de que algo de mal acontecesse ao nosso irmão. E depois, porque quando tudo terminou, com a graça de Deus - bem, os pais foram encontrá-lo no local onde ele tinha sido deixado, porém, Rafael já estava a caminho de casa, a pé.
Aquela história se tornou um marco, pois já em casa, Rafa testemunhava como havia pedido ao rapaz - o assaltante - para tocar o CD do Shalom enquanto estavam andando no carro, pois estava nervoso e a música o acalmaria. E, buscando tranquilidade, passou a conversar com o rapaz, falando de Deus, explicando o sentido daquela música, sendo voz de Deus naquela vida, que possivelmente era um deserto duro e árido. O assaltante o deixou, são e salvo. Levou o carro e prometeu devolver sem as rodas e a aparelhagem de som.
Nos reunimos em sua casa e com sua família, fizemos um grande momento de louvor para bendizer a Deus por Seu grande amor e misericórdia. E, houve uma surpresa para todos quando, mais tarde, aquele rapaz que havia sequestrado e assaltado o Rafa, voltou para trazer o carro para sua casa.
Tocou a campainha e jogou a chave na garagem, pedindo perdão, dizendo que no veículo, tudo estava intacto. Ele levaria somente aquele CD, junto com o CD da Banda Vida Reluz, pois as músicas o haviam tocado muito.
"Queria estar! Queria viver! Queria ser! Havia entendido que era em Deus que desejava depositar a sua vida."
Algum tempo depois Rafael faria uma cirurgia e antes, decidiu que precisava confessar-se e buscar a benção de Deus. Começou essa busca um bom tempo antes.
Lembro-me que no dia 13 de maio daquele ano, 2003, fomos à Santa Missa Solene de Nossa Senhora de Fátima, na paróquia próxima às nossas casas. Quem estava lá celebrando era Dom Odilo Pedro Scherer. Rafael fez questão de chegar bem perto do Bispo e pedir a benção para sua cirurgia. E assim o fez. Com o Bispo e com todos os sacerdotes que encontrava. Falava de sua cirurgia e pedia uma bênção especial.
Chegou o dia da Cirurgia… Aconteceria às 07 horas da manhã de 07 de junho de 2003.
Como muito amigos e confidentes que éramos, passávamos bastante tempo juntos, e Rafael me pediu que passasse a noite anterior à cirurgia com ele no hospital. E com a autorização do médico e de sua família, assim foi feito.
Todos os irmãos de Comunidade foram até a porta do hospital, em carreata, para vê-lo entrar para aquela internação pois após a cirurgia ele sairia outro, como ele mesmo dizia. Aquela intervenção cirúrgica era um desejo de seu coração, que há meses ele vinha buscando e se preparando. Era uma cirurgia bariátrica, pois estava bastante acima do peso e entendia que aquilo atrapalhava a realização dos planos e sonhos que - com a ajuda de Deus - buscava viver.
Naquela noite no hospital, cantamos, rezamos e rimos muito a ponto de as enfermeiras precisarem nos pedir para rir mais baixo. Rafael levou consigo para o hospital uma bonequinha de Santa Rita, que nossa irmã Paula e eu havíamos feito alguns dias antes. E também um livro que havia acabado de ser lançado, intitulado “O meu lugar é o Céu”, escrito pelo Padre José Augusto, Sacerdote da Comunidade Canção Nova.
Rafael desejava o Céu, queria estar perto de Deus. E desejava estar diferente depois daquela cirurgia, para que, com menos problemas de saúde e indisposições, pudesse se dedicar ainda mais nesta busca do Céu, que sentia, já era dele.
Nosso irmão, Rafael Parisi Catarino partiu naquele dia 07 de junho de 2003, por volta das 18 horas, em decorrência de uma embolia pulmonar pós cirúrgica. Era um menino, tinha somente 19 anos. Mas, como dizem os versículos do Livro da Sabedoria: “Sua alma era agradável ao Senhor, e é por isso que ele o retirou depressa do meio da perversidade. Os povos que veem esse modo de agir não o compreendem, e não refletem nisto: que o favor de Deus e sua misericórdia são para seus eleitos, e sua assistência está no meio de seus fiéis." (4, 14-15)
Rafa é um irmão muito amado por todos. Após esses 20 anos é sempre lembrado em nossas orações e missas da comunidade, em nossas formações, conversas e momentos de partilha e convivência. Até mesmo os irmãos que não o conheceram, amam o Rafa, pela importância que ele tem em nossa história.
Na homilia em sua missa de corpo presente, Padre Lotívio Antônio Finger, scj, à época, Pároco da Paróquia Nossa Senhora da Candelária, que havia atendido a confissão do Rafael no dia anterior ao da cirurgia fez questão de lembrar o desejo de santidade que aquele rapaz havia expressado ao fazer sua confissão.
O temos como nosso irmão no Céu, intercedendo pela Comunidade, pelo carisma e pela missão. Pelos membros Consagrados e Vocacionados, para que sejam fiéis, como ele buscou ser e busquem a santidade acima de tudo.
Relembro todas essas passagens com saudade. Pedindo ao Bom Deus, a graça de caminhar em busca da santidade, sem reservas, como fez o Rafael em sua tão breve vida, a fim de que um dia possamos nos encontrar na vida eterna, que já é dele e pode ser meu e seu, se formos fiéis.
Graça e Paz!
Célia Regina
Vocacionada do Encontro
Comunidade Católica Instrumento de Deus
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Você pode ler, nas imagens abaixo, a carta que Rafael escreveu para a Comunidade Shalom testemunhando a experiência do sequestro relâmpago. Agradecemos a sua mãe e irmã por autorizar e contribuir a divulgação da história deste nosso irmão e disponibilizar algumas fotos incluindo o testemunho que segue:
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